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A comida é a nova internet?

Transformações no setor de alimentos criam oportunidades para o desenvolvimento de tecnologias e negócios em toda a cadeia produtiva

Kimbal Musk é um sul-africano famoso pelo estilo cowboy e por ter feito fortunas com seu irmão Elon durante o boom da internet nos anos 1990. Mais recentemente, ficou conhecido pelo seu amor pela alimentação - mais especificamente, por afirmar em diversas conferências e entrevistas que a comida é a nova internet. Mas qual é a relação entre essas duas coisas?

A internet surgiu para solucionar uma questão muito específica: a falta de comunicação entre computadores. Um problema que ninguém sabia que tinha mas, uma vez resolvido, foi impossível voltar atrás. E não porque a tecnologia é imprescindível, mas sim porque desencadeou transformações de comportamento profundas. Através dos computadores que se comunicavam, pessoas também passaram a se comunicar. A internet se integrou às atividades do dia a dia em uma simbiose perfeita, fazendo parte do estilo de vida da maioria da população mundial e impactando os modos de comunicação e compartilhamento de informações. Trata-se não mais de um ambiente virtual neutro restrito às tecnologias envolvidas, mas um território de convivência e circulação de ideias e opiniões tão complexo quanto a vida real.

A todo momento assistimos ao surgimento ou à atualização de bens e serviços propiciados pelo meio de comunicação. As mídias sociais definiram novas formas de relacionamento entre as pessoas; as fintechs têm revolucionado o mercado financeiro; passamos a organizar nossa vida e nosso tempo com ajuda de aplicativos inseridos em telefones, televisores, relógios, eletrodomésticos com sensores dentre outros; a indústria artístico-cultural se molda aos novos comportamentos de consumo que migram cada vez mais rápido para plataformas de streaming; com a pandemia, crescem as demandas de teletrabalho, telemedicina, compras online e educação à distância.

Para cada um desses setores, existe uma cadeia imensa de indústrias, serviços, pesquisas científicas, novas tecnologias, inovações e profissionais envolvidos. A movimentação financeira é incomensurável. Só para citar um exemplo, o Banco Central divulgou um dado afirmando que os recursos movimentados pelo internet banking no Brasil somaram R$ 4,313 trilhões, 430% a mais que os R$ 814,26 bilhões transacionados nos caixas de autoatendimento.

Atualmente, poucas coisas são tão essenciais para as pessoas quanto a comunicação. Uma delas é a alimentação. E isso também está prestes a passar por uma transformação profunda catalisada por avanços tecnológicos, assim como foi com a comunicação a partir da chegada da internet.

A nova comida é de verdade?

Voltando um pouco no tempo é possível perceber o potencial que novas tecnologias ligadas à alimentação tiveram e continuam tendo nas transformações vividas pela humanidade. A 1ª Revolução Agrícola ocorreu em torno de 10.000 aC e foi caracterizada, sobretudo, pela domesticação de animais e plantas. Em síntese, para manter um ser vivo (animal ou planta) domesticado para sua própria alimentação, o ser humano devia mantê-lo a seu alcance; alimentá-lo; protegê-lo dos predadores; cuidar para que cresça e se reproduza; e armazená-lo de forma adequada após o abate. 2.020 dC, vivemos a 4ª Revolução Industrial e o processo é basicamente o mesmo.

A grande diferença é que hoje temos o desafio de domesticar animais e plantas para alimentar uma população de 7,5 bilhões de pessoas. E quanto mais animais domesticados, maior a quantidade de plantas necessárias para alimentar estes rebanhos. Os dados da Organização das Nações Unidas nos mostram que estamos falhando nessa missão. Enquanto você lê este texto, 820 milhões de pessoas, 4 vezes a população do Brasil, passam fome no mundo. Parte do problema se deve ao desperdício, já que 30% de tudo que é produzido no planeta ou vai para a lixeira ou se perde ao longo da cadeia produtiva. A ONU também acredita que em 2050 teremos uma população de quase 10 bilhões de pessoas e que para alimentá-las com a mesma quantidade de proteínas que consumimos atualmente teremos que aumentar a nossa produção em 70%. Tudo isso dentro de um contexto onde praticamente já esgotamos os nossos recursos naturais disponíveis para a pecuária, especialmente água e solo, e que cada vez mais o consumidor pede uma alimentação que seja, ao mesmo tempo, saborosa, sustentável, segura, saudável e justa.

Kimbal defende uma transição para a “comida de verdade” para darmos conta do recado. Ele não deixa dúvidas sobre o que está querendo dizer: a comida que ele defende deve ser nutritiva para o consumidor, para a comunidade e para a terra. E só é possível juntar essas três frentes de nutrição por meio da aplicação de tecnologia de forma ao mesmo tempo intensiva e adequada ao campo. As principais inovações que vão ajudar a levar comida de verdade até o prato dos consumidores são:

fazendas verticais a técnica de plantar alimentos em torres verticais traz diversos benefícios. Proporciona uma otimização da utilização do espaço, aumentando consideravelmente a produtividade de alimento por metro quadrado. Também é possível dar novo uso a espaços que antes eram inutilizados, como velhos containers e espaços vazios em prédios. Ao invés de plantar em solo, os cultivos são feitos por aeroponia e hidroponia, o que diminui em muito o consumo de água de irrigação e utiliza-se iluminação artificial feita por LEDS, ajustada especificamente para cada espécie sendo cultivada. O ambiente controlado não é suscetível a variações de temperatura e do ambiente, evitando assim flutuações de produção e infestações de insetos e outras pragas, dispensando o uso de pesticidas. As fazendas verticais também encurtam a cadeia de produção, uma vez que ficam mais próximas ou mesmo dentro das cidades. Não há necessidade de vencer longas distâncias para chegar ao consumidor, o que também diminui o impacto ambiental normalmente gerado pelo transporte terrestre.

● Carne Cultivada: é a carne de sempre, mas produzida de forma diferente. Em ambiente fabril, uma pequena cultura celular é retirada do animal vivo, sem necessidade de abatê-lo. Utilizando técnicas de reprodução de tecidos, as células são nutridas e passam a se multiplicar. No final do processo, a carne obtida é idêntica àquela consumida tradicionalmente, mesmo em nível celular. O risco de contaminação por microorganismos comuns em frigoríficos é extremamente reduzido nesse processo, assim como a necessidade de agroquímicos e as consequências ambientais de seu uso. O impacto ambiental do processo todo é significativamente menor pois utiliza menos água e solo. A tecnologia pode ainda ir além do suprimento de carnes de criação, como gado, frango, porco e peixe, por exemplo. Ao se estabelecer na sociedade, a agricultura celular pode, também, ser utilizada para recriar carnes de caça e de animais exóticos, o que é especialmente importante para espécies ameaçadas de extinção. Outro ganho importante é a possibilidade de manusear os componentes do produto final, produzindo alimentos que não seriam possíveis de serem obtidos de animais vivos, como carnes sem colesterol, carnes de mamíferos terrestres com boas doses de ômega três ou ainda produtos “desenhados” pela engenharia de alimentos de forma que atendam necessidades especiais e restrições alimentares dos consumidores, por exemplo.

● Bioimpressão 3D: a tecnologia que começou como uma forma de melhorar a qualidade de vida de astronautas em missões de longa duração no espaço já deu grandes saltos em direção a se tornar primeiro viável para indústria para em seguida se tornar acessível às pessoas comuns. As ‘biotintas’ que a impressora usa são feitas a partir de ingredientes crus, que então são depositados camada a camada para formar designs feitos em computador. Se ainda é necessário fritar ou assar o que é impresso, já existem cientistas pesquisando como utilizar feixes de laser para cozinhar os alimentos no momento em que estão sendo montados. A ação de selecionar ingredientes possibilita desenvolver alimentos com nutrientes específicos, como maior concentração de determinada vitamina ou ausência de colesterol, por exemplo. Essa seleção ainda abre a possibilidade de desenvolver alimentos que atendam à necessidades individuais de saúde, como a de celíacos por exemplo. O potencial para contribuir com a boa saúde é ainda maior uma vez que os avanços tecnológicos passem a incorporar medicamentos na composição dos alimentos feitos em impressora 3D. Outra possibilidade já sendo testada por algumas empresas é a impressão de carne cultivada através de impressoras 3D, potencializando as vantagens de ambas tecnologias.

Agricultura de precisão: é quando se faz uso de diferentes tecnologias para captação de informações detalhadas sobre as plantações, combinando-as para fazer uma análise precisa das condições do solo e das plantas. Dessa forma, é possível identificar deficiências, pragas, crescimento e absorção de nutrientes e irrigação e nutrir a plantação apenas com o que é necessário – evitando desperdício de recursos naturais, uso excessivo de pesticidas, economizando tempo de trabalhadores rurais e aumentando a produção.

Drones na inspeção de plantações: esse método faz uso de drones para captar informações em tempo real das plantações, tanto das condições do solo como de plantas individuais. Eles são capazes de captar imagens de altíssima qualidade, com mais precisão do que o olho humano seria capaz, e também percorrer uma área maior e mais diversa em muito menos tempo – coletando dados sobre diferentes variáveis, tornando o manejo das plantações mais eficiente e produtivo. Também é possível utilizar essas informações para comparar condições e colheitas através dos anos e fazer mapas de irrigação, por exemplo. Além disso, evita com que trabalhadores se exponham a riscos desnecessários como exposição prolongada a climas extremos ou terrenos instáveis.

Como toda inovação disruptiva, essas invenções só deixam os centros de pesquisa e ganham o mundo quando atraem a atenção de empreendedores. A junção de tecnologia e empreendedorismo para solucionar desafios específicos da alimentação já tem nome: FoodTech. É uma combinação poderosa das áreas de biotecnologia e engenharia de alimentos, com a instituição britânica The Food Tech Matters prevendo que esse mercado atinja o valor de US$ 249 bilhões (£196 bi) em 2022 globalmente. O número de investimentos que movimenta também impressiona, chegando a US$ 1,3 bilhão em 2018 e triplicando nos últimos quatro anos. E não são apenas startups que atuam nesse novo ecossistema. Cada vez mais grandes nomes como Bill Gates e empresas tradicionais do ramo da alimentação se interessam pelas possibilidades de inovação das FoodTechs. A tradicional empresa de carne Tyson Foods, por exemplo, investiu significativamente na Memphis Meats, startup que trabalha para desenvolver carne cultivada. A mensagem é clara: novas formas de produção significam maior variedade de produtos e, consequentemente, mais opções para os consumidores e crescimento para as empresas.

Movimento semelhante já é visto no mercado brasileiro. As gigantes da alimentação nacional Seara, Marfrig, JBS e BRF também aumentaram seu portfólio recentemente com produtos à base de proteínas alternativas. O grupo Mantiqueira, maior produtor de ovos da América do Sul, lançou em 2019 o N.Ovo, um substituto vegetal para os ovos tradicionais. Apesar de o estabelecimento de FoodTechs no Brasil ser recente, caminha a passos rápidos. Apenas no último ano, o avanço de tecnologias de produção de alimentos inundou o mercado brasileiro com novos produtos. A startup de proteínas alternativas Fazenda Futuro, que iniciou suas atividades em maio de 2019 com apenas um hambúrguer vegetal, terminou o ano oferecendo também almôndega, carne moída e linguiça vegetais. Neste ano, a startup recebeu o seu segundo aporte de investimentos (R$ 115 milhões), elevando o seu valor de mercado para R$ 715 milhões.

Por se tratar de um segmento em crescimento, cria oportunidades para o desenvolvimento de novos atores, de novas unidades de negócios em indústrias já estabelecidas a novas startups, de habitats de inovação especializados em foodtechs a grupos acadêmicos de pesquisa e desenvolvimento focados em proteínas alternativas. Tudo isso cria as condições necessárias para revolucionar essa necessidade tão básica e fundamental que é a nutrição dos seres humanos.

A última grande revolução na alimentação foi a invenção do microondas, em 1970. Assim como muitas das técnicas descritas acima, ele enfrentou resistência inicial mas, uma vez que sua utilidade foi entendida e assimilada pelas pessoas, é impossível imaginar a vida sem ele. Cinquenta anos depois, é hora de revolucionar a alimentação mais uma vez. Como produzimos e consumimos o que chega ao prato está prestes a passar por transformações tecnológicas que vão mudar, para sempre, nossa relação com a comida. Ainda bem.


Sobre o GFI

O The Good Food Institute (GFI) é uma instituição sem fins lucrativos que trabalha para acelerar transformações na cadeia de produção de alimentos. Para isso, foca no desenvolvimento do mercado de proteínas alternativas, apoiando especificamente os setores de proteínas vegetais e de carne cultivada. Essas novas fontes de proteínas complementam a oferta global de alimentos, disponibilizando mais alternativas semelhantes às de origem animal para os consumidores do mundo todo. A organização possui Selo Platinum, certificação máxima de transparência concedido pelo GuideStar, maior banco de dados e informações sobre organizações sem fins lucrativos do mundo, e reconhecimento da Animal Charity Evaluators.








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